domingo, 28 de novembro de 2010

A ciência política

OEstado é uma instituição tão antiga quanto a família. Desde os grandes impérios da Antiguidade até as atuais sociedades industriais e pós-industriais, a presença do Estado é notável. E é, sem dúvida, um dos principais objetos de estudo das ciências sociais, especialmente a sociologia e a ciência política.

A questão do Estado

A palavra “Estado” contém vários significados. O Estado pode ser sinônimo de governo, de Estado-Nação ou país, de regime político e de sistema econômico. Contudo, afirmamos que o Estado é um conceito que deve ser compreendido a partir de uma perspectiva histórica.
O Estado pode ser definido como um poder político centralizado e exercido sobre um povo localizado em um território delimitado. Temos então o chamado Estado moderno, surgido na Europa renascentista, sob forma de monarquias absolutistas, em que as propriedades do reino eram do rei, ou seja, não existia o espaço público. Sem falar na ausência da sociedade civil — no lugar do cidadão havia o súdito ou o que se submetia.
A ascensão e os valores da burguesia deram-lhe condições para ocupar o lugar da nobreza e dos reis. A burguesia afirmava que seus interesses eram os mesmos das classes populares, principalmente do campesinato. Baseada nesse argumento, a nova classe dominante tomou o poder do Estado e, com a limitação do poder real pelo fortalecimento do parlamento ou pela criação de repúblicas, juntamente com a divisão dos três poderes (legislativo, executivo e do judiciário) e o estabelecimento da soberania popular e do direito à insurreição ao governo, constituiu-se o Estado nacional.
Esse Estado possui um poder político-administrativo exercido sobre uma população nacional em um contexto geográfico delimitado, mas agora é parte da respectiva sociedade, e não algo distinto dela. A dualidade entre o Estado e a sociedade civil é o diferencial entre os estados absolutistas e os estados nacionais.
Diante desse fato, os estudiosos de política procuram esclarecer como se dá a relação entre essas duas entidades. Existem duas matrizes fundamentais: a contratualista e a marxista. A primeira argumenta a necessidade de um poder maior, que mantenha ordem dentro de uma sociedade, por meio do estabelecimento de um contrato social entre seus membros para instituir o Estado. Seus principais adeptos são Thomas Hobbes, John Locke e Jean-Jacques Rousseau. A matriz marxista tem como princípio a luta de classes sociais refletida no Estado, de tal maneira que este poder é exercido pela classe dominante, no caso a burguesia. Além do próprio Marx e de Engels, seus seguidores Lênin, Gramsci e Poulantzas compartilhavam da mesma ideia.
No século XX, o Estado teve um papel crescente no aspecto econômico dos países. Até a Crise de 1929, era responsável somente pela manutenção da estabilidade monetária e tinha o equilíbrio fiscal como regra. Depois da grande crise, foi necessária a intervenção econômica do Estado para que se mantivesse a demanda agregada do mercado, realizando obras públicas, fazendo grandes investimentos e produzindo insumos (ações e petróleo, por exemplo), a exemplo do que ocorreu nos Estados Unidos com o New Deal do presidente Franklin Delano Roosevelt.
Com o fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), a economia capitalista conheceu um período de prosperidade, marcado pela atuação do Welfare State (ou Estado de Bem-Estar Social). Esse ciclo esgotou-se no início da década de 1970, e desde então se apregoa a necessidade de uma reforma do Estado. Essa proposta foi sugerida pelos neoliberais, que querem o mercado no lugar do Estado, mas é rechaçada pelos vários adeptos do keynesianismo. Uma alternativa conhecida como Terceira Via afirma que é possível uma reforma do Estado, cedendo funções e serviços para o mercado e o terceiro setor, mas sem abrir mão do poder de legislar e tributar e do uso exclusivo da violência (poder de polícia) .




Gabarito referente a aula, 30/11

1. Alternativa B

As concepções de liberdade, igualdade e fraternidade, desenvolvidas a partir da segunda metade do século XVIII com o Iluminismo, fundamentam as leis da sociedade moderna.

2. Alternativa F, V, F, V, V

A Constituição brasileira de 1988, conhecida como “Constituição Cidadã”, prevê direitos sociais e políticos, o que anula a primeira proposição. É responsabilidade do Estado, em maior ou menor grau, garantir os direitos huma­nos e sociais; isso anula a terceira proposição.

3. 21 (01 + 04 + 16)

Proposição 02: falsa. O princípio de cidadania remonta à Grécia Antiga.

Proposição 08: Do ponto de vista legal, os direitos de cidadania nem sempre foram um privilégio exclusivo das elites econômicas, a exemplo das sociedades democráticas modernas.

4. Alternativa A

De acordo com o texto, o capitalismo globalizado busca a homogeneização cultural, o que implica na eliminação das especificidades culturais de cada povo.

5. Alternativa B

Numa perspectiva negativa, a globalização é vista como uma das principais causadoras do aumento da exclusão social, ao intensificar o desemprego estrutural.

6. Alternativa D

O Estado moderno foi assentado nos princípios de Estado-Nação, território e soberania.


quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Foto Gilberto Freyre
Segundo Freyre, a formação da cultura brasileira é o resultado do sincretismo cultural processado entre o português, o índio e o africano escravo, que acabou originando uma cultura ímpar, diferente na sua formação, fortemente mestiçada e sincretizada, uma cultura marcada pela diversidade de contribuições culturais do negro, do índio e do português, que acabou por constituir um conjunto de expressões culturais diversas.
A constituição da cultura brasileira seria resultado desse processo de sincretismo e miscibilidade; o brasileiro seria resultado de um intercurso racial e cultural democratizado e do encontro das culturas, um encontro democrático, ausente de conflitos. Entretanto, alguns pensadores se contrapõem à ideia de “democracia racial” devido ao fato de esta deixar de lado o fenômeno do preconceito racial e cultural existente no Brasil; um preconceito não declarado, mas inculcado no inconsciente coletivo.
Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982) foi outro intelectual que abriu uma nova discussão acerca da sociedade brasileira na década de 1930. Em 1936, ele publicou Raízes do Brasil, uma obra de orientação weberiana que enfatiza os aspectos culturais do Brasil para a compreensão do nosso desenvolvimento social, político e econômico. É dele o conceito de “homem cordial” para caracterizar o brasileiro.

As primeiras concepções teóricas 1.sobre a sociedade brasileira: evolucionismo versus culturalismo G9

Compreender o processo de constituição da sociedade brasileira já era uma preocupação de alguns intelectuais brasileiros no final do século XIX e no início do século XX. Ao analisarmos esse período, é importante ressaltar dois dados: primeiro, a abolição do modelo escravista em 1888, lançando o negro numa sociedade autoritária e racista; segundo, a predominância das teorias evolucionistas europeias. É esse panorama histórico que marca as primeiras reflexões dos brasileiros sobre a sua sociedade.
Alguns intelectuais brasileiros, como Sílvio Romero, Nina Rodrigues e Euclides da Cunha, discutiam nesse período a problemática da identidade nacional e da cultura brasileira. Ficam claras nesses pensadores as influências das teorias racistas e evolucionistas; percebe-se um impacto muito grande do positivismo de Comte e do darwinismo social.
Nesse sentido, os temas analisados por esses pensadores, como a religião africana, os movimentos messiânicos e a composição racial do brasileiro, são tratados sempre à luz dos conceitos racistas e evolucionistas.
Em 1933, surgia no Brasil uma obra inaugural sobre a sociedade brasileira vista pelo viés cultural: Casa Grande e Senzala, de Gilberto Freyre (1900-1987). Essa obra resultou da tese de doutorado de Freyre, cuja orientação coube a Franz Boas. Nesse livro, Gilberto Freyre procura se afastar da visão evolucionista sobre a sociedade brasileira e a analisa exatamente pela miscigenação cultural, afirmando ser essa a nossa principal característica.

Sociologia do Brasil G9

A partir do que foi discutido desde o capítulo um até aqui, vamos agora pensar sobre algumas questões acerca da sociedade brasileira fundada pelos portugueses no século XVI. Abordaremos as diferentes visões teóricas sobre a nossa formação social, assim como o desenvolvimento das relações de trabalho e do Estado brasileiro, buscando perceber algumas “permanências” que existem hoje em nossa realidade social como frutos do tipo de colonização que sofremos.

Cultura e sociedade G9

Um dos grandes ramos das Ciências Sociais, além da Sociologia e da Ciência Política, é aquele que se dedica aos estudos da cultura desenvolvida pelos seres humanos: a Antropologia. Logo, neste capítulo, estudaremos o significado social de cultura, além do nascimento da Antropologia e de suas correntes de investigação. Outra questão a ser abordada, que é de extrema importância para compreender as relações sociais contemporâneas, será a da relação entre produção cultural e produção capitalista. Bom estudo!

terça-feira, 7 de setembro de 2010

G8 O estruturalismo

Vimos até aqui como a Antropologia procurou respostas objetivas para poder entender os povos africanos e asiáticos, por causa do processo de expansão neocolonialista. Também estudamos que as diferenças entre estes povos e os europeus eram significativas. Assim, foram elaboradas teorias sociais que esclareceram como estes povos organizavam suas relações sociais e estabeleciam os seus diversos valores.

Uma das teorias expostas foi o evolucionismo, que estabelecia uma sequência de etapas de desenvolvimento, na qual o último e superior estágio seria a sociedade industrial europeia. O funcionalismo foi a teoria posterior que criticava o eurocentrismo do evolucionismo e propunha uma pesquisa participante para que se obtivesse a compreensão das organizações sociais distintas das existentes na Europa.

Porém, uma nova teoria de antropologia cultural surgiria no século XX, o estruturalismo, que procurou corrigir as falhas existentes no funcionalismo.

A origem do estruturalismo vem da linguística, ciência que estuda a linguagem através da teoria de um consagrado pensador, Ferdinand de Saussure, criador da Semiologia, ciência que estuda os signos em geral. Segundo Saussure, os homens possuem várias linguagens, como gestos, objetos, sons e palavras escritas e faladas, que, por sua vez, possuem sentidos, e estes configuram uma estrutura inconsciente de comportamento humano.

Podemos entender o estruturalismo como uma teoria que procura o conhecimento da realidade a partir da pesquisa de aspectos subjetivos e imaginários dos homens e de seus respectivos grupos sociais. A antropologia cultural também sofreu influência dessa teoria e seu maior expoente é Claude Lévi-Strauss.

Lévi-Strauss é belga, nascido em 1908. Formado em Direito, foi professor de Filosofia até vir para o Brasil em 1934, para lecionar na USP, até 1937. Realizou estudos sobre os índios bororos durante sua permanência no Brasil. Seus livros mais conhecidos são Tristes trópicos, As estruturas elementares de parentesco, Antropologia estrutural e O pensamento selvagem.

A antropologia estrutural de Lévi-Strauss tem como princípio maior o reconhecimento da existência de uma estrutura social. É através desta estrutura que ocorrem as relações entre elementos, grupos e instituições de uma comunidade qualquer.

G8 O funcionalismo

A visão de Franz Boas acerca do trabalho antropológico fez surgir uma corrente de pensamento conhecida como funcionalismo. Partindo do princípio de que qualquer sociedade possui sua lógica de integração e é composta por partes interdependentes, este sistema social se define pela função de satisfazer suas necessidades de alimentação, defesa e habitação. Assim, podemos compreender uma sociedade como não primitiva por não comungar do casamento monogâmico, mas saber que a poligamia se executa por ser importante na manutenção desta mesma sociedade.

Para poder conhecer realmente estes povos e o funcionamento de sua organização social, é necessário usar um método de pesquisa que possa ser capaz de dar conta de todos os detalhes, por mais insignificantes que possam parecer. O método adotado foi o do trabalho de campo, sugerido por Boas, e que aqui ficou sendo conhecido como método da observação participante. Consiste na inclusão do pesquisador na realidade social em estudo, para poder captar as informações do objeto de estudo em questão sem correr riscos de se deixar levar pelo etnocentrismo (achar seu povo superior aos outros) ou mesmo pelo eurocentrismo (considerar a sociedade europeia como modelo e padrão social).

Buscando superar os resultados preconceituosos e racistas obtidos pelos evolucionistas, a teoria funcionalista tem as condições para apresentar uma concepção mais científica das sociedades e povos diferentes da cultura europeia. Seus principais autores são o polonês Bronislau Malinowski (1884-1942) e o inglês Alfred Radcliffe-Brown

G8 Do evolucionismo à diversidade cultural

No início do século XX, um pensador alemão chamado Franz Boas (1858-1942) revolucionou a prática antropológica, criticando a antropologia de gabinete exercida principalmente por Frazer e Tylor.

Para Boas, o antropólogo, ao analisar as outras culturas para compreender a diferença, não se deve partir do ponto de vista de sua cultura e sociedade; pelo contrário, o antropólogo deve partir para a convivência direta com a cultura a ser pesquisada, a fim de perceber as suas peculiaridades.

Franz Boas coloca o trabalho de campo como prática necessária para a compreensão exata e neutra das outras culturas; a prática etnográfica torna-se fundamental, pois a etnografia proporciona uma descrição antropológica densa. O antropólogo deve anotar tudo o que ele observa e ouve no trabalho de campo para, desta maneira, aproximar-se de uma interpretação impessoal sobre as culturas diferentes.

Nesse momento, as culturas exóticas perdem o aspecto de culturas desconexas e incompreensíveis e passam a receber uma coerência e funcionalidade, que só foi apreendida através da aproximação e do contato direto do antropólogo com a cultura dita “estranha”.
Uma das primeiras definições de cultura apareceu na obra do antropólogo inglês Edward B. Tylor (1832-1917). De acordo com esse autor, cultura é o conjunto complexo de conhecimentos, crenças, arte, moral e direito, além de costumes e hábitos adquiridos pelos indivíduos em uma sociedade. Trata-se de uma definição universalista, ou seja, muito ampla, com a qual se procura expressar a totalidade da vida social humana, a cultura universal.Já o antropólogo alemão Franz Boas, que desenvol-veu a maior parte de seus trabalhos nos Estados Unidos, tinha uma visão particularista. Ele pesquisou as dife-rentes formas culturais e demonstrou que as diferenças entre os grupos e sociedades humanas eram culturais, e não biológicas. Por isso, recusou qualquer generalização que não pudesse ser demonstrada por meio da pesquisa concreta.

TOMAZI, Nelson Dacio. Sociologia para o Ensino Médio. São Paulo: Atual, 2007, p. 171.

Assim, o conceito de desigualdade cultural é substituí-do pelo conceito de diversidade cultural; agora a análise antropológica ganha um aspecto particularista, isto é, as sociedades devem ser compreendidas nas suas especificidades, contrariamente à análise universalista dos evolucionistas.

Surgiram daí outros pensadores, como Bronislaw Malinowski, que consolidou o método funcionalista, sobre o qual falaremos a seguir. Franz Boas também foi o orientador da tese de doutoramento do brasileiro Gilberto Freyre, cuja obra tornou-se fundamental para o estudo da sociedade brasileira. Falaremos de Freyre mais à frente.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Cultura e sociedade G7

A palavra “cultura” tem múltiplos significados dentro do nosso idioma. Um deles é cultura enquanto plantação, como, por exemplo, cultura de arroz. Cultura, neste caso, vem do verbo cultivar. Outra concepção para cultura é enquanto sinônimo de erudição. Erudição é a característica de pessoas detentoras de vasto e profundo conhecimento em diversos assuntos. Dessa maneira, podemos nos referir a esses indivíduos como cultos. Mas, a princípio, tal ideia de cultura ainda não nos dá o sentido sociológico que buscamos apreender. Afinal, qual o significado de cultura que nos interessa então? Para as Ciências Sociais, cultura diz respeito a toda manifestação material e não-material de um povo ou grupo social. Logo, cultura é tudo aquilo que passa pela ação do trabalho humano, através do qual somos capazes de transformar a natureza. Sendo assim, toda produção, seja ela material (artesanato, comidas, roupas, moradias, ferramentas, entre outros) ou não material (linguagem, histórias, ideias, projetos, entre outros) é não natural ou cultural. Em suma: cultura é toda manifestação humana proveniente do trabalho, que é a maneira por excelência de explorar a natureza e obter a subsistência.

Além dessa concepção importante para nós, temos outra que é de cultura como parte de uma sociedade ou povo, ou seja, um povo ou nação possui manifestações típicas de sua cultura. No caso do Brasil, temos vários exemplos, desde os mais estereotipados, como o carnaval, o futebol e o celebrado “jeitinho brasileiro”, passando pelos menos percebidos, como a nossa alegria de viver, o descaso com horários, regras e convenções e a informalidade nas mais diversas relações sociais. Tal ideia de cultura contempla também a ciência ou a produção artística, como a telenovela – exemplo mais notório dos últimos quarenta anos.

A função da cultura é tornar a vida segura e contínua para a sociedade humana. Ela é o “cimento” que dá unidade a um certo grupo de pessoas que divide os mesmos usos e costumes, os mesmos valores.Desse ponto de vista, portanto, podemos dizer que tudo o que faz parte do mundo humano é cultura e que todos nós somos cultos, pois dominamos a cultura do nosso grupo, seja ele urbano ou rural, indígena ou de outra etnia, de uma ou de outra crença religiosa ou de qualquer outro tipo.

ARANHA, M. L. A., MARTINS, M. H. P. Temas de Filosofia. 3. ed. São Paulo: Moderna, 2005, p. 21.

A diversidade cultural é um fato relativo à própria espécie humana, que, através do surgimento e da formação de sociedades variadas, tem produzido uma série de culturas diferentes. Por exemplo, não exageramos ao afirmar que existe uma cultura latino-americana, mas é errôneo pensar que as realidades distintas, como a brasileira, a mexicana e a argentina, possam expressar culturas iguais. Sem dúvida, existem muitas semelhanças, mas, em meio a um processo de globalização e padronização cultural, as culturas das sociedades modernas buscam preservar suas particularidades culturais, como se isso fosse, mais que uma resistência, uma forma de preservação de identidades.

Atividade Sugerida

Forme um pequeno grupo com seus (suas) colegas de sala para ler o texto e, a seguir, fazer o levantamento de exemplos dos dois tipos de concepções de cultura apresentadas pelo autor.As duas concepções básicas de culturaAs várias maneiras de entender o que é cultura derivam de um conjunto comum de preocupações que podemos localizar em duas concepções básicas.A primeira dessas concepções preocupa-se com todos os aspec-tos de uma realidade social. Assim, cultura diz respeito a tudo aquilo que caracteriza a existência social de um povo ou nação, ou então de grupos no interior de uma sociedade. Podemos assim falar na cultura francesa ou na cultura xavante. Do mesmo modo falamos na cultura camponesa ou então na cultura dos antigos astecas. Nesses casos, cultura refere-se a realidades sociais bem distintas. No entanto, o sentido em que se fala de cultura é o mes-mo: em cada caso dar conta das características dos agrupamentos a que se refere, preocupando-se com a totalidade dessas caracte-rísticas, digam elas respeito às maneiras de conceber e organizar a vida social ou a seus aspectos materiais.(...) Vamos à segunda. Neste caso, quando falamos em cul-tura, estamos nos referindo mais especificamente ao conheci-mento, às ideias e crenças, assim como às maneiras como eles existem na vida social. Observem que mesmo aqui a referência à totalidade de características de uma realidade social está presente, já que não se pode falar em conhecimento, ideias, crenças sem pensar na sociedade à qual se referem. O que ocor-re é que há uma ênfase especial no conhecimento e dimensões associadas. Entendemos nesse caso que a cultura diz respeito a uma esfera, a um domínio da vida social.De acordo com a segunda concepção, quando falarmos em cultura francesa poderemos estar fazendo referência à lín-gua francesa, à sua literatura, aos conhecimentos filosófico, científico e artístico produzidos na França e às instituições mais de perto associadas a eles. Outro exemplo comum desta concepção de cultura é a referência à cultura alternativa, compreendendo tendências de pensar a vida e a sociedade na qual a natureza e a realização individual são enfatizadas, e que tem por temas principais a ecologia, a alimentação, o corpo, as relações pessoais e a espiritualidade. Ao se falar em cultura alternativa, incluem-se também as instituições asso-ciadas, como lojas de produtos naturais e clínicas de medicina alternativa, e, da mesma forma, seus meios de divulgação.

SANTOS, José Luiz dos. O que é cultura. São Paulo: Brasiliense, 1983. Coleção “Primeiros Passos”.

Conceito e evolução do trabalho G7

O trabalho está constantemente presente em nossas vidas e na realidade que nos cerca. A Física entende que trabalho é todo movimento concretizado. Assim, as máquinas trabalham, os animais trabalham e, obviamente, os seres humanos trabalham.

A diferença entre o trabalho humano e os outros trabalhos é que o do homem não só possibilita a satisfação das suas necessidades, através da exploração da natureza, mas também a modifica. Pode-se dizer que o trabalho é fundamental para que ocorra a chamada cultura humana, ou seja, tudo aquilo que é feito pelo homem através da relação entre o seu trabalho e a natureza.

Figura: Andre Gorz (1923-2007)

Segundo o filósofo austro-francês André Gorz, autor do livro Adeus ao proletariado, há dois tipos de trabalhos realizados pelo homem: o autônomo e o heterônimo. Suponhamos que um operário de uma empresa metalúrgica produza autopeças para carros durante os dias da semana e cultive hortaliças nos fins de semana. A atividade de fim de semana é o trabalho autônomo ou consciente, enquanto fabricar as peças de automóveis em troca de salário mensal é o trabalho heterônimo ou alienado.

Conforme se organiza o trabalho heterônimo, pode-se saber como os homens constroem sua vida econômica, política e social. Vejamos a trajetória histórica desse tipo de trabalho.
Durante a Antiguidade Clássica (Grécia e Roma), os homens livres, principalmente os proprietários de terras, vangloriavam-se de possuir escravos e de manter o ócio, ou seja, não trabalhar. Ser escravo é ser propriedade de outro homem. O labor (trabalho) era considerado indigno de seres libertos. Daí, poderíamos deduzir que no mundo clássico ser considerado humano era ser livre, até do trabalho e, para isso, ser proprietário de escravos.

A palavra “alienação” tem um conteúdo jurídico que designa a transferência ou venda de um bem ou direito. Mas, desde a publicação da obra de Rousseau (1712-1778), passa a predominar para o termo a ideia de privação, falta ou exclusão. Filósofos alemães, como Hegel e Feuerbach, também fazem uso da palavra, emprestando-lhe um sentido de desumanização e injustiça que será absorvido por Marx. Este faz do conceito uma peça chave de sua teoria para a compreensão da exploração econômica exercida sobre o trabalhador no capitalismo. A indústria, a propriedade privada e o assalariamento alienavam ou separavam o operário dos “meios de produção” – ferramentas, matéria-prima, terra e máquina – e do fruto de seu trabalho, que se tornaram propriedade privada do empresário capitalista.

COSTA, C. Sociologia: introdução à ciência da sociedade. 3. ed. São Paulo: Moderna, 2005 Na Idade Média, o trabalho passou a ser considerado como um castigo de Deus, ou a função da maioria dos camponeses. O vínculo do trabalhador com o senhor feudal era intermediado pela terra, pois o nobre necessitava do trabalho do servo e este, de terra livre dos invasores bárbaros.
Segundo Santo Agostinho, em seu livro Cidade de Deus, a vida terrena deveria se espelhar no reino de Deus para poder sobreviver frente à ameaça dos bárbaros pagãos. Ao clero, cabia a função de manter a comunicação entre os homens e Deus; aos nobres, fazer a guerra contra os inimigos do reino e, por fim, aos servos, trabalhar!

Com o advento do capitalismo, o trabalho começou a deixar de ser negativo entre a classe dominante, no caso, a burguesia. Transformou-se no principal valor econômico e o ócio perdeu a importância para o negócio, ou seja, a “negação do ócio”. A burguesia se constituiu como um grupo social ligado ao trabalho mercantil, isto é, ao comércio. Paulatinamente, os mais variados trabalhadores passaram a receber um salário mensal para, em troca, produzirem bens econômicos. Começava, dessa maneira, o papel do trabalho no capitalismo.

Figura:
O casal Arnolfini, de Jan van Eyck (1434). Este quadro, da época renascentista, retrata uma típica família burguesa da época, que encontrava cada vez mais espaço social por meio de sua ascensão econômica proveniente do trabalho mercantil.

Trabalho e sociedade G7

O trabalho humano é um dos principais meios de relações sociais, já que por meio dele é que transformamos a natureza para, assim, nos tornarmos seres produtores de cultura, o que também nos diferencia dos outros animais. Para a Sociologia, o estudo do trabalho e suas implicações são de fundamental relevância para a compreensão das sociedades.

O nascimento da Antropologia G7

A Antropologia é uma ciência que nasceu na Europa, na segunda metade do século XIX. Seu nascedouro correspondeu à expansão imperialista europeia sobre o continente africano. Os contrastes entre povos africanos e nações europeias contribuiram para estudos comparados à luz de teorias biológicas evolucionistas. Tais estudos se constituíram como a base de uma antropologia conhecida por Física. O contato com os povos africanos também foi instigante para os estudiosos da vida social, pois esses grupos não possuíam língua escrita, daí a necessidade de uma nova ciência para compreendê-los. Com ausência de uma cultura escrita, os antropólogos foram obrigados a descobrir outras maneiras de entender essa realidade social.

Antropologia"Ciência social que estuda as manifesta-ções culturais dos grupos humanos, assim como a origem e a evolução das culturas. São objeto de estudo da Antropologia a organização familiar, as religiões, a magia, os ritos de ini-ciação dos jovens, o casamento etc. A palavra antropologia – do grego antropus, homem, e logia, estudo – significa eti-mologicamente a ciência do homem. Divide-se em Antropo-logia Física, Antropologia Social ou Cultural e Antropologia Filosófica."

OLIVEIRA, Pérsio Santos de. Introdução à Sociologia. 25. ed. São Paulo: Ática, 2004, p. 240.

Entretanto, podemos apontar o nascimento de uma reflexão pré-antropológica que data da época da chegada dos europeus à América, que eles chamaram de “Novo Mundo”. A expansão ultramarina europeia dos séculos XV e XVI possibilitou o contato do homem europeu com culturas e povos totalmente distintos. Alargou-se a experiência da alteridade, ou seja, o conhecimento do “outro’’, o “outro’’ como sendo o diferente, o exótico, o atípico e o “não familiar”.

Os primeiros contatos fizeram surgir posições e comentários diversos, às vezes exaltando o estranho, às vezes diminuindo-lhe a importância. Opiniões desse caráter foram comuns nos séculos XVI, XVII e também no XVIII. O contato com outras culturas sempre foi marcado por considerações duplas e relativas: às vezes trata-se o índio – no caso brasileiro – como um ser agradável, ingênuo e solidário; às vezes ele pode ser classificado como um ser próximo da animalidade da natureza. Num momento existe uma exaltação do “outro’’; em outro momento existe uma depreciação desse “outro”.

Vejamos o exemplo de Hans Staden, um alemão que esteve na América portuguesa no século XVI e acabou prisioneiro de uma tribo tupinambá, na região do atual litoral de São Paulo. Sobre os nativos que conheceu, ele escreveu: “São ociosos, preguiçosos, de pouco trabalho, melancólicos, covardes, sujos, de má condição, rústicos, bestiais e vegetam como a umidade dos trópicos, são infelizes, pois vivem na escuridão das florestas”.

Um ritual antropofágico observado por Figura 6.1. Hans Staden (no alto da imagem, de barba).

Enquanto Staden manifesta uma visão “negativa” a respeito dos nativos, o padre espanhol Bartolomé de Las Casas, integrante da Ordem dos Dominicanos que viveu na América, escreveu sobre eles: “as pessoas aqui são nuas, bonitas, de pele escura e corpo elegante, são mansos e vivem em condições de igualdade, são cordiais e amáveis”.

Bartolomé das Las Casas é considerado um dos Figura 6.2. primeiros europeus defensores dos nativos da América.44
Entretanto, não podemos nos esquecer de que os representantes da Igreja Católica, fossem eles dominicanos, jesuítas ou quaisquer outros, mesmo preocupados em defender os índios, compactuavam a ideia de convertê-los em católicos, o que impunha aos nativos um processo de negação de suas crenças, ou seja, uma aculturação.

Na tentativa de fazer prevalecerem os valores católicos europeus sobre os nativos da América, ocorreu aquilo que chamamos de etnocentrismo, ou seja, a cultura europeia foi colocada no centro como a única correta, sendo imposta então aos povos ameríndios. Por etnia podemos considerar exatamente o conjunto de valores e crenças (a cultura) manifestado por um determinado povo. Por se tratar de uma imposição feita pelo dominador sobre o dominado, o etnocentrismo gerou situações de discriminação e preconceito étnico, o que, infelizmente, pode ser presenciado em nossa realidade social até os dias atuais. Por se tratar de um etnocentrismo específico da visão europeia, podemos classificá-lo como eurocentrismo.

Até o século XIX, as considerações pré-antropológicas só conseguiram emitir conceitos desse tipo, às vezes subjugando e inferiorizando as culturas diferentes, às vezes elevando e exaltando a condição cultural do desconhecido, ainda que a primeira visão prevalecesse sobre a segunda. Foi sob esse olhar que a Antropologia se estabeleceu como ciência no século XIX: muito mais afirmando do que negando as proposições preconceituosas da pré-antropologia.